Patrimônio histórico do povo
Existem muitos elementos que podem ajudar a se conhecer a história de um povo. Nos estudos da sociedade, esses elementos são classificados como patrimônio histórico, podendo revelar traços artísticos e culturais de um povo. Por sua vez, um patrimônio histórico é classificado como material ou imaterial. As manifestações artísticas, por exemplo, fornecem informações relevantes sobre como cada povo expressa a sua visão de mundo e são classificadas como patrimônio imaterial.
Devido à importância desses registros, a preservação de qualquer patrimônio é essencial para que a cultura de uma comunidade possa sobreviver às mudanças da vida.
No Brasil, um exemplo de patrimônio é o grafismo Kusiwa, um sistema de representação gráfica. Desenvolvido pelo povo Wajãpi, da região do Amapá, esse sistema foi incluído no rol das manifestações a serem preservadas pelo Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 2002. Em 2017, o grafismo Kusiwa passou pela revalidação, um processo previsto para acontecer a cada dez anos, foi para analisar se o patrimônio continua relevante na sociedade.
Como era de se esperar, essa revalidação foi comemorada pelos indígenas Wajãpi.
O grafismo Kusiwa
Provavelmente, a marca cultural mais característica desse povo é a arte visual conhecida como Kusiwa, que constitui uma linguagem gráfica e um sistema de comunicação. Essa forma de pintura se vale de elementos geométricos que representam a natureza e a maneira de ver o mundo do povo Wajãpi.
O grafismo Kusiwa é feito com tintas extraídas de frutas, como o urucum e o jenipapo, misturadas a determinadas resinas, como a da árvore breu-branco, que conferem um perfume característico à composição.
Esse grafismo é marcado pelos padrões geométricos e adorna tanto os corpos dos indígenas quanto objetos feitos por eles. Para aplicar as tintas, os Wajãpi utilizam pinceis, carimbos ou algodões.
História e tradição
Historicamente, esse grafismo é ensinado aos jovens entre 10 e 20 anos por seus pais ou por pessoas mais velhas. Não há uma padronização nas formas dos desenhos, que é deixado para que cada sujeito possa se manifestar livremente. De forma geral, aproveitam-se as formas, como os triângulos, mas cada Wajãpi expressa a realidade por meios de pinturas que acabam por se tornar particulares. Além disso, por causa da complexidade nos padrões, esse povo acredita que ninguém domina completamente a forma de expressão Kusiwa antes dos 40 anos.
Mesmo que a expressão possa ser manifestada livremente por cada Wajãpi, há uma série de regras no grafismo Kusiwa. Por exemplo, a tinta do urucum, que fornece coloração avermelhada, deve ser preparada sempre pelas mulheres. Já o jenipapo, que fornece uma tinta preta, deve ser colhido por aqueles que vão utilizá-lo, e as crianças não devem jogá-lo no chão, pois isso significa que seus pais não terão vida longa.
No que diz respeito aos desenhos em si, determinadas formas e traços não podem, de acordo com a tradição, serem juntados ao se realizar a pintura, sob o risco de atrair má sorte ou problemas de saúde. Da mesma maneira, determinados padrões gráficos podem ser utilizados apenas para mulheres; outros, apenas por homens; e existem os padrões que todos podem usar.
Além disso, em alguns momentos existem restrições. Durante o período da menstruação, a pessoa fica impossibilitada de fazer certos desenhos. Algumas pinturas também são impedidas em recém-nascidos.
Origem do Kusiwa
Os Wajãpi narram o surgimento do grafismo Kusiwa por meio de uma lenda que explica que eles não são os donos dos desenhos (nem de outras manifestações, como cânticos e danças), mas que esses pertencem aos animais, tal como a sucuri, as borboletas ou os pássaros. Por essa maneira bastante particular de se ornamentar e de se relacionar com a natureza é que os Wajãpi são denominados como guardiões da floresta e se esforçam para que sua cultura seja preservada.
Quem são os Wajãpi?
Os indígenas Wajãpi são membros de um grupo pertencente ao ramo linguístico tupi-guarani, habitando atualmente o noroeste da região Norte do Brasil, embora sejam originários do Pará, de onde migraram no século XVIII.
Atualmente, devido a diversos processos históricos ocorridos na história do país, há menos de mil Wajãpi, cuja existência é constantemente ameaçada por garimpeiros e mineradores ilegais.
Esse povo vive em uma área rica em ouro e em ferro e, por isso, são alvos frequentes de invasores, mesmo que tenham terras demarcadas desde 1996.
Na década de 1970, em virtude de epidemias de malária e sarampo, decorrentes do contato com pessoas não indígenas, vários Wajãpi foram mortos, chegando a restar apenas 70 membros de sua etnia naquela ocasião.
Os Wajãpi vivem da caça, da pesca e da prática da agricultura. Eles possuem inúmeros rituais e celebrações que marcam a vida da comunidade, sendo conhecidos por serem bastante festivos.
Referências bibliográficas
Amapá – Arte Kusiwa. iPatrimonio. Disponível em: https://www.ipatrimonio.org/amapa-arte-kusiwa/#!/map=38329&loc=1.1787550000000038,-52.767663,17. Acesso em: 13 abr. 2024.
Arte Kusiwa – Pintura corporal e arte gráfica Wajãpi. Iphan. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Arte%20Kusiwa.PDF. Acesso em: 22 abr. 2024.
Kusiwarã. Instituto IEPÉ. Disponível em: https://institutoiepe.org.br/2023/11/kusiwara/. Acesso em: 13 abr. 2024.
ODILLA, F. Quem são os wajãpi, guardiões de terra cobiçada por garimpeiros ilegais e mineradoras. BBC, 29 jul. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-49152403. Acesso em: 13 abr. 2024.
Saiba mais sobre a pintura corporal e arte gráfica dos povos indígenas Wajãpi do Amapá. Fundação Nacional dos Povos Indígenas, 19 jan. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/funai/pt-br/assuntos/noticias/2023/saiba-mais-sobre-a-pintura-corporal-e-arte-grafica-dos-povos-indigenas-wajapi-do-amapa. Acesso em: 13 abr. 2024.
Wajãpi. Povos Indígenas do Brasil. Disponível em https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Waj%C3%A3pi. Acesso em: 13 abr. 2024.
Quer saber mais? Conheça a nossa plataforma!