O conceito
A identidade de uma pessoa ou de um povo pode ser definida como a característica que os torna um só. É a resposta para a pergunta: “O que é ele?” ou “O que são eles?”. Muitos elementos estão em jogo para a construção da resposta, como aspectos biológicos, psicológicos e sociais. As transformações que ocorrem na puberdade, por exemplo, são componentes biológicos que influenciam na formação de um indivíduo. Em termos sociólogos, essa pergunta está ligada àquilo que a sociedade entende como identidade (são construções sociais). Para muitos sociólogos, a noção antiga de identidade está em declínio, dando lugar para um novo indivíduo fragmentado. É a chamada “crise da identidade”. De acordo o sociólogo britânico-jamaicano Stuart Hall, existem três concepções de identidade: o sujeito do iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno.
O sujeito do iluminismo
É tido como um indivíduo centrado e unificado, dotado de capacidades e da razão. A ideia é a de que a razão e a ciência iriam responder todas as questões existenciais e materiais. Pode-se dizer que três eventos históricos foram importantes para a construção do sujeito iluminista. Primeiro, com a revolução cultural tem-se o renascimento rompendo com as ideias medievais, além da passagem de uma sociedade teocêntrica para uma sociedade antropocêntrica. Outro evento importante é o surgimento do Calvinismo. Com a reforma protestante, tem-se a noção de prosperidade por meio do trabalho (que foi importante para o desenvolvimento do capitalismo e da revolução científica). Por fim, com a revolução industrial o capitalismo se torna cada vez mais voraz, criando indivíduos que começam a questionar o seu papel social. Há então o surgimento do sujeito sociológico.
O sujeito sociológico
Aqui, fica ainda mais clara a relação entre a sociedade e o “eu” na formação da identidade. A identidade é um somatório do sujeito e da estrutura a qual ele faz parte. O sujeito sociológico não depende apenas de si. Dois pensadores se destacam na análise deste momento: Marx e Freud. De acordo com Freud, além dos aspectos conscientes, também faz parte da construção da identidade o inconsciente. Já para Marx também devemos considerar as relações do indivíduo com a sociedade. Assim, um indivíduo é tido como o fruto das transformações sociais. Segundo Hall, algumas sociedades buscam, neste período, reorganizar os seus processos de construção de identidade. Mas, segundo ele, essa busca é utópica, pois a busca é feita tendo em vista um “povo original”. Na prática, toda cultura é formada por várias culturas.
O sujeito pós-moderno
A característica marcante de tal indivíduo é a de possuir várias identidades (até mesmo identidades contraditórias). Além disso, ele possui uma identidade “móvel”, ou seja, o sujeito assume identidades distintas em diferentes contextos. Uma boa maneira de entender as transformações que a identidade vem sofrendo na pós-modernidade é compará-la com o período tradicional.
Para a identidade tradicional (o tipo de identidade que constitui o sujeito do Iluminismo, por exemplo) o passado é venerado e os símbolos perpetuam uma experiência de gerações. A tradição é o meio de dar continuidade aos velhos valores e as práticas sociais são recorrentes. No fundo, a tradição constitui o povo. Datas festivas, comemorações e manifestações religiosas são feitas sempre da mesma forma.
De acordo com a identidade moderna, no entanto, as práticas sociais são reformuladas sempre que novas informações chegam. Os choques culturais oriundos do processo de globalização levam a uma reflexão do sujeito sobre as suas próprias referências e assim, as práticas tradicionais passam a ser questionadas. Pode-se dizer que as sociedades modernas não possuem um guia central e não se desenvolvem tendo em vista uma única causa.
A identidade no mundo globalizado
De fato, o aspecto da pós-modernidade que parece ter um maior impacto na construção da identidade é a globalização. A globalização acaba alterando aquilo que é entendido como “identidades nacionais”. As identidades nacionais são construções que se manifestam em um sistema de representação cultural. Na era pré-moderna, tal ideia podia ser encontrada nas tribos, na religião, na região ocupada e foi se transformando até se tornar algo como uma cultura nacional (com a criação dos Estados Nacionais). Essa noção de identidade tem impactos variados: padrões de alfabetização, uma língua única dominante, uma cultura homogênea, instituições culturais nacionais, etc.
Agora, com a globalização, as identidades nacionais passam a se desintegrar, algumas passam a se tornar mais rígidas em uma resposta para tentarem se manter ainda hegemônicas, e algumas entram em declínio, dando lugar à uma identidade híbrida. Como resultado final dessas transformações, surgem algumas posturas bastante ativas e muitas vezes opostas frente à própria noção de identidade. Por um lado, temos aqueles que buscam manter a estrutura vigente, ressaltando os ideais de identidade do período pré-moderno. Por outro lado, grupos sociais antes marginalizados (seja devido à sua classe, gênero, sexualidade, etnia, nacionalidade, etc.) passam a fazer resistência ao grupo dominante.
Para entender as identidades na prática
Assim como Hall, o sociólogo espanhol Manuel Castells também distingue três tipos de identidade: a “legitimadora”, a “de resistência” e a “de projeto”. Essas formas de identidade coexistem no período pós-moderno. A identidade legitimadora é introduzida pelos grupos dominantes (pode-se dizer que são resquícios de um sujeito iluminista). Já a identidade de resistência surge nos grupos marginalizados e tem o intuito de resistir à dominação. Por fim, há a identidade de projeto em que os atores sociais passam a criar uma nova identidade na tentativa de transformar toda a estrutura social.
Entre os principais exemplos de identidade legitimadora estão o fundamentalismo religioso e o nacionalismo. O fundamentalismo islâmico, por exemplo, é uma reação contra a modernização. Já o fundamentalismo cristão tem entre suas causas a crise do patriarcalismo e o temor do processo de globalização. Para ilustrar a identidade de resistência, Castells menciona os movimentos sociais. Segundo ele, a desintegração dos mecanismos de controle social abre espaço para que as pessoas busquem assumir o controle de suas próprias vidas. A esse respeito destacam-se a crítica ao patriarcalismo (discutido por movimentos feministas, gays e lesbianos), o feminismo (que, como uma identidade coletiva, tornou-se porta-voz das causas sobre a opressão feminina) e os movimentos de liberação lesbiano e gay (que são expressões de identidade sexual). Por fim, essa resistência dá lugar à construção de projetos que contestam a lógica dominante. Tais projetos surgem justamente a partir das identidades de resistência: religiosas, nacionalistas, étnicas, territoriais, feministas e ambientalistas.
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